A geração nem-nem precisa sonhar, diz orientadora de carreira

Adriana Gomes, coordenadora nacional de Carreira e Mercado da ESPM, avalia porque muitos jovens de hoje não estudam e nem trabalham

 

A geração “nem-nem” não surfa na onda de quem quer viver à base de sombra e água fresca. Ao contrário, ela é reflexo de um sistema de ensino deficiente que não oferece a bagagem completa para a formação de capacidades que ajudem o jovem a ter maturidade necessária para trabalhar. O resultado são jovens que retardam o ingresso na faculdade ou que desistem de fazer um curso superior porque não sabem que caminho seguir. “Mas o caminho só existe quando você passa”, afirma Adriana Gomes, coordenadora nacional de Carreira e Mercado da ESPM, citando uma frase extraída da música Acima do Sol, da banda Skank.

 

Adriana recebeu a reportagem do #TMJ para falar diretamente com os “nem-nem” e dar pistas do que fazer para não desistir antes de começar. Um destaque da conversa é a importância da valorização dos sonhos. Todo mundo deveria ter um sonho para perseguir e concretizar, e de maneira geral ele está diretamente relacionado com trabalho, profissão ou carreira. “As pessoas estão matando os sonhos e precisam resgatar isso, não tem motivação maior do que buscar alguma cosia que seja sua. Se você não sonha, só sobram as coisas que são muito difíceis na vida”. Confira a entrevista:

 

É justo afirmar taxativamente que os “nem-nem” não querem saber de nada?

O termo “nem-nem” surgiu por conta da convergência de duas condições: o jovem não estuda porque terminou ensino médio e não ingressou na faculdade e nem trabalha. O que acontece é que o mercado busca pessoas com um mínimo de qualificação e o ensino médio muitas vezes não oferece essas capacidades. Quem estuda em escola pública sai do colégio sem o preparo que o mercado deseja e não tem condições de fazer uma leitura adequada de suas qualificações pessoais que favoreçam o desenvolvimento de competências para o mercado, e que podem ser colocadas em um currículo para um estágio ou primeiro emprego.

 

O mercado busca pessoas com um mínimo de qualificação e o ensino médio muitas vezes não oferece essas capacidades”

 

Então você está dizendo que um dos problemas é o ensino que não prepara as pessoas?

O Brasil tem uma situação educacional ruim. Os índices internacionais de avaliação mostram que infelizmente o país está em uma situação lamentável comparado com outros países. Os resultados do Pisa 2022 provam isso. Em matemática, ficamos 93 pontos abaixo da média, que são 472, e em leitura, foram 410 pontos, contra a média de 476. Esses resultados dizem muito. Como os estudantes não têm essa qualificação mínima de interpretação de texto e capacidade de fazer contas básicas de matemática, isso dificulta que tenham oportunidades para melhores vagas de estágio ou trabalho. Inclusive, essa má formação impacta até mesmo no desempenho do estudante no Enem e na possibilidade de ingresso na faculdade.

 

 

Por conta dessas deficiências você acha que os jovens desistem ou retardam o ingresso na faculdade?

Isso pode acontecer talvez pela frustração de o jovem se sentir pouco estimulado e não ver razão de continuar investindo em educação. A outra hipótese do não estudar pode ser muita dúvida na escolha um curso de graduação, da ansiedade e do medo de não dar certo. Às vezes as pessoas com menos condição financeira não querem investir numa tentativa porque acham que não vão conseguir.

 

Geração nem-nem precisa sonhar
Geração nem-nem Foto: Shutterstock

O que poderia ser feito para ajudar o estudante?

Tem programas bacanas como Jovem Aprendiz, de incentivo para as empresas contratarem menores de idade, que tem várias contrapartidas. O estudante não é encarado como mão de obra barata. O programa tem uma jornada de ensino para esse jovem. Ele trabalha e participa de um curso de formação com vários conteúdos que ajudam a desenvolver habilidades que o mercado deseja. Ele vai ter uma vivência corporativa que extrapola o ambiente da escola, que nem sempre é o mais estimulante para a aprendizagem.

 

 

O que mais o estudante poderia fazer além do Jovem Aprendiz?

Ele deveria ter iniciativa própria de buscar conhecimento por meio de programas, cursos e atividades extra escolares. Também pode ir num lugar praticamente abandonado nas instituições de ensino, que é a biblioteca e que ensina além do TikTok e do YouTube. As bibliotecárias são formadas para ajudar as pessoas. Com elas posso obter informação sobre como começar a trabalhar a partir de bons livros. Mas isso depende de iniciativa e proatividade, tem que ter isso e se perguntar: “O que que eu quero para mim? Quero ficar para trás e ser mediano?”.

 

 

No mundo atual, em que as pessoas não conseguem prestar atenção a um vídeo de mais de 2 minutos, não é tão simples o jovem desenvolver essa autonomia de estudar por conta própria…

O que faz com que as mudanças ocorram é sempre o desejo de melhorar, progredir e ir além. Se não houver desejo isso não vai acontecer. E o desejo pode vir de questionamentos. “O que tenho que fazer para ser um profissional de destaque?”. Para organizar esse pensamento, um mapa mental pode funcionar. O primeiro passo é definir o objetivo, que, na verdade, é o sonho, e a partir dele procurar entender o que deve ser feito para a sua concretização. No mundo de hoje essa coisa de ter um sonho anda meio apagada, é como se as pessoas não fossem capazes de realizar as coisas e o sonho morresse na matriz.

 

No mundo de hoje essa coisa de ter um sonho anda meio apagada”

 

Será que o cenário atual, e a diminuição dos postos de trabalho por conta do uso da inteligência artificial em determinadas operações, não figura como num choque de realidade e os jovens acham que o futuro não tem lugar para todo mundo?

Essa coisa de que a IA vai acabar com o trabalho é mito. A questão é que o jovem já sufoca o sonho quando tem esse pensamento de que não vai ter onde trabalhar. Ele pensa “para eu não me frustrar, nem vou fazer”, e aí ele não sente impulso de escolher uma graduação que tenha a ver com ele e que possa extrair seu potencial profissional. Ele esquece que a frustração faz parte do amadurecimento do ser humano e do desenvolvimento do aprendizado. Tem que aprender a lidar com isso e não evitar, porque o medo é paralisante. Já pensou se o Steve Jobs tivesse tido medo?

 

Essa coisa de que a IA vai acabar com o trabalho é mito”

 

Pegando esse gancho do Jobs, você acha que conhecer histórias de pessoas disruptivas como ele, ou de grandes personalidades da história e do universo corporativo pode ajudar?

Pessoas com histórias de superação podem ser inspiradoras. O próprio Steve Jobs não nasceu milionário, sofreu bullying, mas não desistiu do sonho dele. Isso não é poesia, é vida real. Mas tem que trabalhar. Tá cheio de exemplos de pessoas que transformaram a vida delas e de outras pessoas, como o Edu Lyra da ONG Gerando Falcões, por exemplo, ou a Bianca Andrade, dona da marca Boca Rosa. Ela nasceu na favela, virou influenciadora e hoje é CEO. Ela tinha um sonho e acreditou.

 

 

Mesmo se baseando em boas histórias de vida, talvez o estudante ainda careça de força própria para ir adiante na busca pelo conhecimento e na definição de que curso universitário escolher. O que mais você sugere?

O Guia do Estudante tem muita informação sobre profissões e faculdades e pode ajudar, principalmente porque de maneira geral os alunos só pensam no trabalho quando terminam a faculdade, ou acabam fazendo a mesma coisa que os pais. Nesse sentido, o guia pode ajudar na procura de informações sobre profissões. Também acho muito válido seguir executivos, pessoas que admira e formadores de opinião e tentar conversar com eles nas redes sociais.

De maneira geral os alunos só pensam no trabalho quando terminam a faculdade”

 

 

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