Se você tem 20 anos ou menos, pode se considerar um ser “nativo” da internet – e, ao contrário das gerações anteriores, talvez nunca tenha lido um jornal impresso na vida…
Até a virada do século, era dos jornalistas a primazia de definir o que era notícia, o que ia para as primeiras páginas dos jornais ou páginas de revistas ou seria transmitido por telejornais e rádios. Isso mesmo: esse papel, chamado de gatekeeper era de jornalistas. E, para isso, se guiavam por preceitos como noticiabilidade, interesse público – e tendo como norte as quase inalcançáveis objetividade e imparcialidade, bem como o espaço para o contraditório e a isenção entre o que noticiava e os anúncios que traziam em suas páginas ou intervalos comerciais. Ufa…
A democratização do universo da informação veio com o avanço da tecnologia. Agora, cada pessoa lê, ouve ou assiste àquilo que desejar, quando desejar, como desejar. A era do “mando eu!”, podemos dizer. Manda mesmo?
Pois bem: tiramos das mãos dos jornalistas e dos veículos jornalísticos a primazia de dizer às pessoas o que era importante. E passamos às pessoas, certo? Errado…
Quando transferimos para algo chamado algoritmo o direito de nos dizer o que temos de ver (ou o supremo poder de nos mostrar apenas aquilo que o algoritmo acha que devemos ver), tiramos da equação algumas coisas chatas, tipo os legumes que nossos pais tanto insistem em nos oferecer. Em seu lugar, só nos oferecem balas, doces e refrigerantes. Ah, e tem ali, meio que escondido e esporádico, um pouco de legumes…
O que seriam esses “legumes”? A noticiabilidade, o interesse público, a busca pela objetividade e pela imparcialidade. E, pior: a responsabilidade de quem produz a informação. E, dessa forma, criamos coisas novas:
– bolhas: você só vai ver aquilo que sua bolha vê, do jeito que sua bolha pensa, sem o contraditório e sem perder tempo com aquilo que “não interessa”
– quem manda no que você vê: no lugar de jornalistas e veículos conhecidos (e de quem podemos cobrar, caso não concordemos ou achemos que tenham errado), entram os algoritmos que nos enviam aquilo que for melhor para os cliques, o retorno publicitário etc.
– as fake news: afinal, se os fatos vão contra o que acredito, pior para os fatos…
– a “informação” que tem algum interesse embutido: influencers, blogguers, vlogguers e outros produtores de conteúdo, que publicam o que o patrocinador quiser, sem qualquer “legume” de interesse público – mas repleto de interesse do público, entregando aquilo que as pessoas querem (o que, geralmente, se procura fazer com que seja o mesmo que o anunciante quer)
Não estou aqui para puxar a orelha de ninguém – e nem ser o chato que quer o retorno aos “velhos tempos”. Mas talvez seja a hora de entender um pouco melhor que, por mais que você seja a cabeça quando o assunto é informação, existe um pescoço que está virando você para onde quer. Mal não fará aprender a dominar também o pescoço…