Foto: NIS/Roberto Braga
Em palestra no ESPM Soul, jornalista contou dois episódios em que foi atacado após a divulgação de notícias falsas sobre ele
“Se você é acusado de algo na internet é você que tem que provar que não fez aquilo e não quem te acusou”. O comentário é do jornalista e doutor em ciência política Leonardo Sakamoto, que palestrou sobre jornalismo e combate às fake news no ESPM Soul, realizado na na ESPM.
Sakamoto, que cobre política, direitos humanos e trabalho escravo, diz que começou a receber mais ataques nas redes a partir de 2013, quando a polarização no Brasil “se transformou em ultrapolarização”. “Quando ultrapolariza, as pessoas passam a entender que o outro lado não merece os mesmos direitos que elas. Aí rompem os laços de empatia”, explicou o jornalista.
Alguns desses ataques (virtuais e físicos) ocorreram após o jornal mineiro Edição do Brasil publicar uma matéria em que Sakamoto supostamente dizia que “aposentados são inúteis à sociedade”. “Tinha minha foto na capa e uma entrevista de página inteira comigo. Mas nunca dei aquela entrevista”. Quando a versão digital da matéria começou a circular, Sakamoto passou a sofrer ataques nas redes sociais. “Em seguida, vieram memes dizendo que eu deveria morrer e que recebi R$ 1 milhão do PT para difamar aposentados”.
“Aprendi que se você é acusado de algo na internet é você que tem que provar que não fez aquilo e não quem te acusou”
O jornalista precisou desmentir o jornal mineiro publicamente. “Muita gente disse que se tive que me justificar, aquilo era verdade. Aprendi que se você é acusado de algo na internet é você que tem que provar que não fez aquilo e não quem te acusou”, comentou.
“As pessoas não se importam se aquilo é verdade ou mentira. Se importam apenas se pode ser usado para atacar o grupo ou partido político que não gostam”
“Um segundo ensinamento da internet é que as pessoas não se importam se aquilo é verdade ou mentira. Se importam apenas se aquilo pode ser usado para atacar o grupo ou partido político que não gostam”.
Para Sakamoto, as agências de fact checking (checagem de fatos) fazem um “trabalho fundamental” no combate as fake news, mas que ele considera “limitado”. “Parte da população que repercute notícias falsas vai absorver o conteúdo dessas agências, mas não vai consertar o seu erro”, comentou o jornalista. “Muita gente já sabe que aquilo é mentira, mas compartilha porque bate no inimigo”.
“Muita gente sabe que aquilo é mentira, mas compartilha porque bate no inimigo”
O jornalista lembra que alguns colegas sugeriram que ele não se preocupasse com a entrevista falsa porque “era só internet”. “Mas aquilo foi para fora da internet, ganhou vida off-line. Fui parado na rua várias vezes. Um dia, um grupo de jovens me rodeou e disse: ‘Quer matar velhinho. Então vamos te matar’. Expliquei que era mentira, mas eles não acreditaram”.
Sakamoto entrou com um pedido de direito de resposta e o jornal mineiro teve que publicar um texto com título “Sakamoto não disse que aposentados são ‘Inúteis à sociedade’”. Mas como comentou o jornalista: “Nunca uma correção vai tão longe quanto um boato”. “Em compartilhamentos, [a fake news] atingiu mais de 1 milhão nas redes sociais e os meus textos e de outros colegas desmentindo aquilo atingiram algo em torno de 30 mil compartilhamentos”.
Fake news do milhão
Em 2015, Sakamoto foi vítima de outra fake news. “As pessoas começaram a me chamar de ladrão nas redes sociais. Eu não entendi o motivo. Dei um Google no meu nome, por sugestão de um amigo, e apareceu ‘Leonardo Sakamoto mente’. Era um anúncio. Você clicava e ia para uma página com uma matéria dizendo que eu ganhava R$ 1 milhão por mês do PT para defender a Dilma”.
“Alguém pagou, botou dinheiro para me difamar. Isso gerou um problema muito maior do que o jornal mineiro, porque caiu na boca de formadores de opinião e saiu em outros veículos de comunicação”, lembra Sakamoto. “Um veículo publica notícia falsa, um segundo maior republica, o terceiro republica e um quarto maior republica. É como uma cebola. Você vai retirando camada por camada e não tem nada lá dentro. Mas por ter várias camadas, parece verdade”.
Nesse caso, as agressões não foram apenas virtuais. “Tentaram cuspir em mim na rua. Fui agredido fisicamente no centro de São Paulo. Em restaurantes, fui xingado. Andando de bicicleta, jogaram o carro em mim”, lembra Sakamoto. “Não existe o sair da internet. As duas camadas (online e offline) fazem parte da sua vida. O que acontece em uma, transborda para a outra”.
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